19/07/2016

Pérolas da opinião alheia e o que eu faço com elas

Estar grávida é absolutamente extraordinário. Não só do ponto de vista biológico, que é por si só assombroso, mas sobretudo do ponto de vista antropológico e, sobretudo, social. Por extraordinário, não quero obrigatoriamente dizer que seja bom, simplesmente que é uma situação fora do normal, pontual e, lá está, extraordinária.
Passar grávida na rua é o mesmo que ter um sinal luminoso a pairar por cima da cabeça. É impossível passar despercebida, pelo menos eu e a minha barriga gigante. É inevitável sentirmo-nos atingidas por olhares escrutinadores de ambos os sexos, muito embora os homens sejam mais discretos do que quando fingem não olhar para o decote de uma mulher que não esteja grávida. Por respeito, suponho, à memória latente das suas próprias mãezinhas.
Tal como é impossível escapar aos tais olhares escrutinadores, é também inevitável sermos agraciadas com o pensamento que o acompanha, dito em voz alta, sem qualquer filtro ou pudor, mesmo que nunca tenhamos visto a pessoa na vida. Esses pensamentos partilhados por estranhos podem ser de vários tipos, consoante a disposição e personalidade da pessoa por quem nos cruzamos. Pode ser um conselho prático, o qual iremos agradecer mentalmente mais tarde quando percebermos que funciona na perfeição, como pode ser uma verdadeira pérola de sabedoria popular ou familiar perfeitamente inútil.
Dentro do primeiro tipo, saliento um, já não me lembro em que circunstâncias o aprendi, que era simplesmente que "os bebés são feitos para andar ao colo". Por alguma razão, essas palavras ecoaram em mim como uma epifania, e desde então, todos os meus filhos andam ao meu colo o mais que eu puder e se eu não puder, ao colo de outra pessoa. Funciona perfeitamente comigo e com os meus filhos, e fiz disso o meu mantra, o qual partilho a quem o quiser ouvir e defendo-o ferozmente nas poucas vezes em que me apanho numa discussões sobre puericultura.
Os pensamentos de segundo tipo, as tais pérolas, são tantos, que dava para escrever um livro. Destes, saliento dois, os que ainda hoje me arrependo de ter seguido e me culpo por ter feito sofrer o meu primeiro filho, mas eu não sabia melhor e quem me deu esse conselho foi TODA A MINHA FAMÍLIA (avó materna, avó paterna, sogra, mãe, pai) e todas as senhoras de proveta idade que eu conhecia e respeitava, exceptuando a minha tia materna (ver acima o comentário do primeiro tipo).
O mais infame de todos é o "deixa-o chorar, não lhe pegues para não ficar mimado". Balelas. Os bebés recém nascidos não se deixam chorar. É uma tortura para eles e para nós, recém mães, que ficamos assoladas por uma angústia enorme e com o coração e as maminhas a doer. Por causa disso, disse o médico, o meu primeiro filho ficou com uma hérnia umbilical do tamanho de uma bola de pingue pongue e anos mais tarde, teve de ser internado no hospital para ser operado, onde ficou conhecido como "o rapaz com o umbigo mais feio do mundo". Deixá-los chorar sozinhos no berço é contraproducente e contranatura e, lá está, os bebés são feitos para andar ao colo.
A segunda pérola que deu para o torto e que eu nunca mais segui foi a transição de leite para sopas e papas aos quatro meses. Compreende-se, num primeiro filho, a excitação era imensa e a curiosidade ainda maior. Mas o meu filho chorava e esperneava como se eu lhe estivesse a fazer algum mal horrível e insistir foi um erro crasso para ele, para mim e para o pai. Foi francamente traumático para mim e acho que uma série de tiques que ele ganhou na infância advêm daí. Infelizmente, a minha excitação ultrapassou o racional e eu não liguei à semântica do folheto do Centro de Saúde que dizia "Aos quatro meses, o bebé pode começar a ingerir alimentos sólidos". PODE e não TEM DE. Faz toda a diferença. Por causa disso, com os outros, comecei a prestar atenção a pequenos sinais que indicavam que o bebé estava pronto para iniciar alimentação sólida. O ter a sensação que dar de mamar não deixava o bebé tão satisfeito assim e o facto de o bebé seguir a colher com o olhar e abrir a boca foram juntos o mais evidente. Cada um deles a seu tempo e a transição correu lindamente,.
Felizmente para mim, tenho tido várias oportunidades para aprender a lidar com um recém nascido. Cada um dos meus filhos foi único desde o primeiro instante, diferente dos outros, com gostos e necessidades muito próprias. Com eles aprendi que cada um é como é e nós, enquanto pais e cuidadores, só temos de observar, respeitar e adaptar. Com esta gravidez, perguntam-me várias vezes como é que eu pretendo fazer acerca do dormir, do dar de mamar, etc, ao que eu respondo invariavelmente:
- Como o bebé quiser e eu conseguir. Simples.

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