09/12/2009

Ana

Chego a casa da eslava com os filhos cheios de bolinhos de côco. Ela levanta-se, muito cerimoniosa e visivelmente feliz em nos receber. Uma visita. Faz café e convida-me para um cigarro. Agradeço quero sim, obrigada. Sinto-me à vontade, sem grandes cerimónias e entramos na cozinha. Tudo limpo. Impecável. Parece-me que vejo o meu reflexo nos azulejos brancos. A casa é igual à minha, o mesmo tamanho, as mesmas divisões, a mesma vista para o palácio no jardim da rua de cima.A minha casa é um caos ao pé da dela. Gosta de plantas, todas verdes e exuberantes, a contrastar com a timidez dos meus três potes de heras e orquídias raquíticas. Bebemos e fumamos enquanto ela vai falando. Fala do filho mais novo, do trabalho, de como gosta de Portugal e das laranjas. Pergunto-lhe o que fazia na terra dela. Percebi que era qualquer coisa entre contabilista e engenheira agrónoma. Aqui trabalha a dias e ganha mais do que eu. Fala quatro línguas diferentes e conhece a Europa quase toda. É uma mulher esclarecida. Não lhe pergunto pelo marido porque não quero saber se foi morto durante a ditadura, refugiado político, qualquer desgraça assim. Digo-lhe que os meus sogros têm laranjeiras e um limoeiro e que também os acho bonitos. Ela gosta de conversar, de estar ali de perna cruzada a fumar um cigarro. O filho dela é o melhor aluno da escola e quando for grande quer ser criminalista forense. Os olhos azuis dela brilham como àgua quando fala do filho. Está convencida de que um dia vai ganhar o euromilhões. Já somos duas.

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